STJ é quem decide conflito de competência entre instâncias de arbitragem

O Superior Tribunal de Justiça é o foro competente para dirimir conflito de competência entre tribunais arbitrais ou mesmo de diferentes painéis de uma mesma câmara, quando tratam da mesma causa. A construção está em um voto do ministro do STJ, Marco Aurélio Bellizze, ao tratar de duas arbitragens no âmbito da JBS: uma aberta por acionistas minoritários e outra pela própria Companhia. Ambas a respeito da responsabilidade dos controladores sobre os fatos narrados no acordo de leniência do grupo. O conflito foi levado ao STJ pela JBS.

As duas arbitragens foram abertas na Câmara de Arbitragem e Mercado (CAM). O ministro decidiu suspender a arbitragem empreitada pelos minoritários — até que a Segunda Seção do STJ decida a matéria — e mandou seguir em frente a da Companhia.

A JBS reclamou que, às vésperas da instauração de ações de responsabilidade dos controladores, para se qualificar como minoritários, um grupo de pessoas adquiriu lotes ínfimos de ações para poder receber “honorários de advogado de 20% [do valor da causa] e o prêmio de 5%, calculados sobre o valor da indenização a que se refere o art. 246 da Lei das S.A.” (e-STJ, fl. 13)”. Mas para o julgamento do recurso, disse o ministro, não faz diferença a questão da legitimidade ordinária ou extraordinária dos atores.

A segunda arbitragem foi aprovada pelos acionistas da JBS em assembleia de outubro de 2020, após demoradas discussões sobre se os controladores da holding poderiam votar ou não na assembleia que daria início a uma ação contra eles. Os irmãos Batista não votaram e a arbitragem foi aprovada pelos demais acionistas, entre eles, o BNDES.

Na ação de conflito de competência, a JBS argumenta que é a única titular dos direitos discutidos nas referidas ações, a quem a lei reserva, com exclusividade, o produto da pretendida reparação. A companhia acusa José Aurélio Valporto e a SPS de atuarem como “acionistas de ocasião” que montam esquemas para extorquir sociedades anônimas com base na brecha da lei.

Valporto e a SPS, por sua vez, argumentam que como a arbitragem iniciada por eles é mais antiga tem precedência em relação a iniciada pelos demais acionistas — o que, para Bellizze só aconteceu porque a Companhia obdedeceu as obrigações legais e protocolos para tomar a mesma atitude.

Ao analisar a matéria, o ministro inicialmente cita o artigo 105, I, d, da Constituição que determina que cabe ao STJ conhecer e julgar o conflito de competência estabelecido entre quaisquer tribunais — inclusive os arbitrais. Ele cita o caráter jurisdicional da arbitragem, sobretudo após a declaração de constitucionalidade da Lei 9.307/1996 pelo Supremo Tribunal Federal por ocasião do julgamento da SE 5.206 AgR, no STF, de relatoria do ministro Sepúlveda Pertence.

Ele também cita o julgamento do Conflito de Competência n. 111.230/DF, de relatoria da ministra Nancy Andrighi, que torna possível afirmar que a Segunda Seção do STJ estabeleceu o caráter jurisdicional da arbitragem, reconhecendo ser possível a existência de conflito de competência entre juízo estatal e câmara arbitral, a ser julgado pelo STJ.

A conclusão decorre do reconhecimento de que o Tribunal arbitral, a despeito de não compor organicamente o Poder Judiciário, deve ser compreendido na expressão “quaisquer tribunais” a que a norma constitucional em questão (art. 105, I, d, CF) se refere.

O ministro argumenta que é possível vislumbrar a possibilidade de configuração de conflito de competência não apenas entre Tribunal arbitral e órgão jurisdicional. Segundo ele, o entendimento contrário implicaria admitir “a subsistência de deliberações jurisdicionais exaradas por Tribunais arbitrais que se excluam mutuamente, como se houvesse um vácuo no ordenamento jurídico, negando-se às partes a definição do órgão (arbitral) efetivamente competente para resolver a causa posta em julgamento”.

Ele também afasta a possibilidade de um conflito de competência estabelecido entre Tribunais arbitrais ser dirimido por um juiz de 1ª instância, independentemente da necessidade ou não de interpretação da cláusula compromissória arbitral. A mesma vedação se aplica a juízos de 2ª instância.

“Importa reconhecer, na verdade, que, se a redação constitucional não pressupõe que o conflito de competência perante o STJ dê-se apenas entre órgãos judicantes pertencentes necessariamente ao Poder Judiciário, de todo descabido estabelecer qualquer vinculação do Tribunal arbitral, que não compõe a organização do Poder Judiciário, a qualquer órgão de primeira ou de segunda instância deste Poder estatal”, explica.

Em relação ao caso concreto, o julgador ponderou que o procedimento arbitral promovido pelos acionistas minoritários — cuja condição foi adquirida após os próprios fatos que deram origem à arbitragem — não teve consentimento da assembleia dos acionistas da JBS que é titular do direito em discussão.

“Por tudo que se expôs, em juízo de cognição sumária, mas com o necessário aprofundamento da questão posta, na medida em que o contraditório já restou aperfeiçoado nos presentes autos, tem-se que o Procedimento arbitral CAM 186/21 atende a preceito basilar da arbitragem (autonomia da vontade e da confiança, em toda a sua extensão), o que, em princípio, não teria sido observado nos procedimentos arbitrais CAM 93-110”, explicou ao determinar a validade da arbitragem iniciada em 2020.

Fonte: Portal Conjur

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